Olhando a velha e desbotada foto
sobre o armário do meu quarto triste,
lembrei-me de um passado tão remoto...
A menina da foto ainda existe?
Onde andará a menininha doce,
cheia de sonhos de contos de fada
como se a única herdeira fosse
da tal felicidade tão sonhada!
Dela era o jardim cheio de flores
e o bem-te-vi que cantava na janela
só para vê-la quedar-se embevecida...
Era dona de todos os amores;
tudo era dela, tão somente dela:
os pássaros, a lua, o sol, a vida...
Pés descalços, corria no gramado,
Jogava amarelinha e, ao fim do dia,
olhando a Estrela d'Alva no horizonte,
adormecia rezando Ave-Maria.
Depois montava na garupa do cavalo
branco e veloz do príncipe encantado
em direção a um castelo bem distante
e jurava para sempre amá-lo.
Mas veio o vento da desesperança
e fez em tiras seu vestido branco
bordado para primeira comunhão,
desfez do seu cabelo a longa trança,
levou para sempre seu sorriso franco,
varreu os sonhos do seu coração.
(Quando o tempo apaga nossos sonhos de bonança,
os anos morrem sobre os anos frios
e o coração fica vazio de esperança).
Por onde andas, menininha linda?
Sai da foto e vem falar comigo!
(Ela me olha e finge que não vê).
Aparece ao menos uma vez na vida!
Sei que posso ser feliz ainda
se algum dia eu encontrar você.
Marlene Rangel Sardenberg
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